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Foto do escritorPsicóloga Angelita Eccel

Pais, filhos e a pandemia

Atualizado: 24 de out. de 2022

Em tempos de catástrofes, como a Pandemia da Covid-19, é importante trazer luz algumas a reflexões, sobre as demandas das crianças, e qual o papel daqueles que exercem a função paterna e materna. Pensando na criança e na sua relação com os pais, sabendo que a família será a primeira base para sua formação, visamos assim, pensar o desenvolvimento e a estruturação psíquica da criança.


Num contexto de catástrofe social, como a Covid-19, se apresentam novas e diferentes dificuldades. A quarentena, por exemplo, é uma situação de extrema insegurança aos pais e consequentemente dos filhos. É uma crise que abala os mais sensíveis, as crianças e os adolescentes.


No período da infância se faz necessário a segurança dos pequenos e isso ocorre através do afeto, do vínculo e do apego. Segundo Bowlby (Apud BEE; BOYD, 2011) “[...] o apego se trata de um tipo de vínculo afetivo permeado pela segurança e conforto referentes a outra pessoa com qual esse ser está se relacionando.” São muitas as incertezas e medos, com isso, surge uma ambivalência nos pais, como por exemplo:

*Se irão trabalhar para trazer o sustento, mas se forem para a rua podem contrair o vírus;

*Outros pais estão trabalhando em casa e precisam dar conta do trabalho e do cuidado dos filhos, e eles se questionam como dar conta, de forma correta, das duas metas;

*Alguns estão desempregados, por isso ficam preocupados de como irão pagar pelas despesas;

*Ainda, tem aqueles que trabalham na linha de frente contra o Covid19, com isso aumenta a preocupação dos adultos e das crianças em relação à doença.


Todas essas circunstâncias causam alguma instabilidade emocional. Assim, podemos observar que essa fragilidade ocasiona nas pessoas um sentimento de raiva, inclusive de tentarem achar um culpado para todos os acontecimentos. Na realidade, nós adultos precisamos encontrar um autocontrole e olhar para o nosso núcleo familiar e observar se ele já não está adoecido.


Momentos de crise, são momentos de união de forças, de ter criatividade e vitalidade para nos proporcionar um ambiente saudável. A nossa competência como pais é linda, porém muitas vezes é complicada e nos exige a delicadeza de muitos cuidados. Refletindo sobre as demandas de pais e pessoas que exercem esse papel, entre elas algumas dificuldades de lidar com medos de seus pequenos, como: *Medo do escuro; medo de que os pais morram; e o medo mais frequente das crianças, o de dormirem sozinhas.


Consequentemente, os pais começam a se questionar, se as crianças estão fazendo manhas em virtude de estarem todos familiares em casa ou será que estão realmente com medo? É possível que as crianças possam estar vivenciando as duas possibilidades, entretanto é interessante levantar algumas hipóteses como:

*O que os filhos de vocês tem produzido durante o dia?

*Quais os programas de televisão vocês têm assistido?

*Os pais têm observado quais os acessos que os filhos estão tendo na Internet?

*Quais os jogos estão jogando?

*O que, vocês pais, tem olhado nos noticiários e comentado o tempo todo?

*Quais são as falas que vocês estão executando perto deles?


Contudo, lembrem-se por favor, as crianças entendem tudo o que vocês falam, porém eles possuem uma dificuldade maior de elaboração, por isso, a importância do cuidado da forma de expor para eles. As crianças podem levar o que escutam para o mundo da fantasia se acaso for mal dito, mal falado, mal explicado ou não usarmos palavras justas, a criança pode entrar em grande sofrimento. Mannoni (apud DOLTO, 2004) utiliza o termo “palavras justas” para nomear a oferta de palavras, por parte de um adulto, que ajudem a criança a nomear algo potencialmente invasivo para ela.


Segundo Kramer, 1999, pg. 272, ele explica que é muito específico da infância, a imaginação, o fantasiar e a criação. Porém, a criança constrói seu mundo de uma forma individual e singular, conforme a sua vivência, sua relação e representação do mundo, que será diferente da representação do mundo dos adultos.


Portanto, devemos refletir que não existe uma receita de bolo pronta, mas é necessário que as crianças saibam sobre a pandemia, sobre as catástrofes e crises, mas de uma forma adequada, que possamos falar dos riscos, da mesma forma das prevenções e cuidados. Imprescindível dar suporte e saídas, explicando, que existem pessoas do mundo inteiro mobilizadas para ajudar os indivíduos a terem mantimentos, que algumas pessoas vão encontrar outro trabalho. Existem alguns pais que estão trabalhando na linha de frente, devem explicar que estão tomando todos os cuidados e por isso, às vezes, estão um pouco mais afastados da família. Além disso, explicar a eles que existem muitos cientistas estudando para produzir soluções.


Enfim, precisamos pensar todas as possibilidades que passam na cabecinha deles. Então, vem algumas questões: será que essa criança vai ficar segura, vai dormir sozinha ou ela vai ficar pensando que as pessoas que ela ama, podem morrer, inclusive ela própria. Você já pensou que o vírus, na fantasia deles, pode ser igual aquele bicho papão da música de ninar que vai pegar eles e a família. Da mesma forma, podem pensar que os pais serão demitidos e consequentemente do mesmo modo, não terão alimentação.


Outro fator fundamental para pensarmos em relação aos que exercem a função parental, que possam, em momentos difíceis, ter um equilíbrio para não ter uma superproteção em relação aos filhos como, escondendo deles tudo que acontece para protegê-los, por exemplo:

*A criança pede algo, você vai e compra para não a frustrar;

*Observou que a criança está com medo de dormir sozinha, então já traz ela para sua cama.

Atitudes de superproteção podem ser devastadoras e agressivas ao desenvolvimento da criança, inclusive não dando a oportunidade da criança se tornar resiliente, de desenvolver a sua segurança. Se você observar que ela está insegura e pontuou medo, pense em algumas alternativas e use a sua criatividade contando algumas histórias, leiam alguns livrinhos com histórias legais, olhem filmes construtivos e apropriados para sua idade, coloquem músicas que expressem cuidados ou até mesmo músicas relaxantes.


Se você esgotou todas essas possibilidades e ainda assim a criança chora e quer ir para o seu quarto. Então, por alguns dias fique um tempo no quarto dela até ela dormir e retorne para seu quarto. Porém, você observou que essa alternativa não ajudou, então traga um colchão para o quarto e durma umas noites ali e vai explicando que será só por umas noites, isso será uma forma de ela perceber que está tudo bem. Outro ponto importante, não minta para seu filho, a confiança e o vínculo são fundamentais para que ele se torne uma criança feliz, um adolescente tranquilo e um adulto seguro.


Inclusive é fundamental durante o dia ou até mesmo a noite fazer uma brincadeira. Segundo Jerusalinski (2014, p236): “Brincar é o próprio trabalho de constituição do sujeito na infância, da inscrição da letra na borda entre o gozo e o saber”. Portanto, se você gosta de algum instrumento, construa uma banda de brincadeira, você pode utilizar até uma panela ou uma lata para ser a bateria. Se você gosta de cozinhar, se vistam de máster chefe e preparem juntos algo para comer. Existem inúmeras formas de você inserir essa criança em algo que possa fazer sentido para ela.


A família é o primeiro modelo para a criança: educadora, incentivadora, apoiadora e nutridora do seu desenvolvimento. Nos primeiros anos da vida, os atributos da personalidade dos pais, sua forma de agir e criar os filhos, o ambiente do lar e a forma de relacionamento são elementos de influência ao desenvolvimento do potencial criativo: se a família provê a criança experiências favorecedoras ao seu desenvolvimento criativo, estimuladoras de sua curiosidade natural e fortalecedoras de sua autoestima, certamente a criatividade aflorará com maior facilidade. (Oliveira, 2010, p, 84)


Nesse instante é importante pensarmos que crises podem durar um tempo, mas passarão. E como nossas crianças vão estar quando isso tudo acabar? Por acaso você já se questionou qual a dinâmica do pós-crise?


Esses primeiros enfrentamentos não são fáceis, especialmente resistir aos pedidos dos pequenos para ficar no nosso ninho, mas dependendo de algumas de nossas ações hoje, com certeza o resultado depois será positivo.


Lembrando aos cuidadores da importância que a criança tenha seu espaço, seu quarto, sua cama. Isso vai colaborar para a criança construir a borda que lhe torna sujeito. Pensando nessa criança em construção, lembramos de qual era o grande vilão das escolas antes da pandemia:

era o transtorno de TDAH e se não tomarmos cuidado esse transtorno será substituído ou virão outras comorbidades como, síndrome do pânico, transtorno de ansiedade, ou até mesmo depressão.


Para uma consideração final é imprescindível atenção na saúde mental de nossos pequenos, proporcionando espaço de escuta e de brincar. Assim, oferecendo possibilidades para esse momento não virar um trauma no futuro dessa criança. Caso você perceba que o sintoma persiste, procure um profissional. Não tenha preconceito de ir a um psicólogo, a um psiquiatra a um especialista da área da saúde, em muitas ocasiões não é para tratar um transtorno, mas sim prevenir de ter um.

REFERÊNCIAS

BEE, H; BOYD, D. A criança em desenvolvimento. 12 ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.

JERUSALINSKY, Julieta. Jogos constituintes do sujeito. In: A criação da criança: brincar, gozo e fala entre a mãe e o bebê. Salvador. BA: Ágalma, 2014. P. 231 – 271.

KRAMER, S. Infância e educação o necessário caminho de trabalhar contra a barbárie. In KRAMER, S et al (Org) Infância e educação infantil. Campinas Papirus, 1999.

MANNONI, Maud. A Criança Retardada e a Mãe. São Paulo, 5º Edição, Martins Fontes, 1999,

OLIVEIRA, Z. M.F. Fatores influentes no desenvolvimento do potencial criativo. Estudos de Psicologia, Campinas. V 27, n1, p 83-92, jan/mar 2010

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